Bairro de classe alta, colado à Barra da Tijuca, o Itanhangá sempre foi sinônimo de exclusividade, com seus residenciais de alto padrão em meio ao verde, e, nas últimas décadas, de desigualdade, na esteira do crescimento de grandes favelas. Nos últimos tempos, é a violência que assusta os cerca de 68 mil moradores da área de 1.319,8 hectares, onde vivem famosos como Xamã, Tatá Werneck, Marcelo Adnet e, mais recentemente, Anitta, que este ano comprou uma mansão de R$ 11 milhões na região. Dois episódios de sequestro de ônibus na Estrada do Itanhangá, uma das principais vias do bairro, há menos de duas semanas, e a invasão, logo em seguida, da comunidade da Muzema por milicianos, que pretendem tomar o controle do local das mãos dos traficantes, fizeram soar um alarme.
A violência em pauta
Na última quarta-feira, o assunto dominou a reunião do 31º Conselho Comunitário de Segurança (CSS), que teve mais de cem participantes.
— Foi uma reunião com mais de cem participantes, incluindo representantes da 16ª DP (Barra), da 42ª DP (Recreio) e do 31º Batalhão — conta Maria Lucia Mascarenhas, presidente da Associação de Moradores do Itanhangá Leste (Ama-IL) e residente no bairro há décadas. — Manifestamos nossa preocupação com essa situação, que tem nos causado medo e apreensão, mas nenhuma medida efetiva foi definida.
Moradias de luxo
Casas de alto padrão em luxuosos condomínios, com vista para montanhas e vegetação de Mata Atlântica, dominam parte da paisagem do bairro, onde não são raros imóveis de mil metros quadrados, em média, avaliados entre R$ 3 milhões e R$ 15 milhões e com IPTU que pode ultrapassar os R$ 20 mil. O Itanhangá Golf Club, na Estrada da Barra da Tijuca, cujos sócios desembolsam mais de R$ 3 mil por mês, atrai visitantes abastados de outras partes da cidade, com seu amplo gramado cercado por montanhas, campos de golfe, quadras de tênis de saibro, escola de polo e equitação, complexo aquático, restaurante, bares e sala de ginástica.
— Quem busca essa região são pessoas, sobretudo artistas, que, depois de um dia inteiro de compromissos, querem chegar em casa e relaxar em meio ao silêncio e conectadas com a natureza. Há várias opções de imóveis praticamente no pé da Pedra da Gávea e até com vista para a Praia da Barra, no caso das residências instaladas em relevos mais altos. Geralmente, são casas com dois ou três andares, quatro ou cinco suítes e 600 metros quadrados de área construída. O Reserva do Itanhangá tem até heliponto — destaca Nayara Técia, CEO da imobiliária On Brokers, que negocia imóveis da região.
Residenciais de classe média também compõem a paisagem do bairro. Um dos empreendimentos, ainda em construção, para esse público é o Conquista Itanhangá, com 400 apartamentos entre 41 e 52 metros quadrados de área e preços a partir de R$ 245 mil.
— Com sua geografia exuberante, a região do Itanhangá é um microcosmo da própria cidade do Rio de Janeiro: é possível encontrar desde comunidades a mansões de milhões de reais, passando por prédios de classe média, sendo a maioria das residências horizontais (casas) — analisa Felipe Macedo, gerente comercial da Direcional, a construtora do residencial.
A convivência com o medo
Na contramão de quem sonha se mudar para o bairro, uma moradora que vive há mais de 30 anos no Itanhangá, nas proximidades da Estrada da Barra, diz que o medo levou muitos de seus amigos a deixarem o bairro nos últimos meses, hipótese que não descarta.
— Morei por muitos anos num apartamento na Gávea e vim para cá porque queria sossego perto de áreas verdes. Você chega ao Itanhangá e vê árvores frutíferas de um lado e de outro. À minha casa vêm miquinhos, tucanos e passarinhos. Parece que você está fora da cidade, porque não se escuta barulho de trânsito e buzina. Mas a paz total ficou no passado. Hoje, somos reféns da violência e estamos pedindo socorro. Há dois meses, um vizinho tinha acabado de chegar do trabalho, ouviu um barulho de tiroteio vindo do Morro do Banco, a mais de dois quilômetros de distância, e, de repente, uma bala atingiu o carro dele. Eu deixei de ir a um mercadinho nordestino na (comunidade da) Tijuquinha que adorava. Já até pensei em me mudar também, mas os imóveis aqui se desvalorizaram muito. Não vale a pena agora — diz.
Favelas reféns
Nas comunidades da região, o clima não é diferente. Tidas como as mais pacíficas da cidade por muito tempo, hoje sofrem com as constantes guerras pelo controle de seu território. Atualmente, o tráfico controla totalmente o Morro do Banco, a Tijuquinha e a Muzema, antes dominados por grupos paramilitares, além de uma pequena parte de Rio das Pedras, berço das milícias no Rio.
— Eu saí de Rio das Pedras em março, porque a comunidade ficou muito perigosa, com tiroteios frequentes. Minha mãe, que ainda mora lá, diz que está com muito medo e que não sai mais depois das 18h. Quando fica até um pouco mais tarde no trabalho, prefere não voltar para casa. Ela fica sempre muito apreensiva e mantém a casa toda fechada, até as janelas. Antigamente, não havia essa preocupação — lamenta um morador.
De acordo com o Rio Ônibus, as linhas que circulam pela região têm sofrido desvios de itinerário quase todos os dias nas últimas duas semanas. A Polícia Militar informa que o patrulhamento foi intensificado na região. Foi exatamente esse o pleito dos moradores na reunião do 31º CCS, na esperança de que a tranquilidade volte a imperar na região.
— O que precisamos é de mais policiamento, especialmente mais viaturas circulando pelo bairro, mas de forma preventiva; não só quando o problema estiver acontecendo — diz Maria Lucia Mascarenhas.